Ouviram do Ipiranga às margens placidas, de um povo heróico um brado retumbante… [treho do Hino Nacional do Brasil]
E foi o brado do guerreiro que fora forjado em suor e sangue, no trabalho pesado que lhe fortaleceu os músculos, no sofrimento que lhe preparou o espírito. O brado que ecoou às margens plácidas dos muitos Ipirangas e correu os quatro cantos do mundo, fazendo levantar tantos outros que ainda que não falassem a mesma língua, compartilhavam o mesmo sentimento: o de liberdade, de respeito, de direitos. Brado que não cala, não silencia; que está nos olhos, no negacear do corpo, no gesto; que se movimenta pelas palavras, pelo cântico; que ganha força no rufar dos atabaques e que vira nação na melodia do berimbau; nação de todos, de homens e mulheres, de todas as cores, de todas as idades, de todas as dores, de todos os amores, de todas as flores, de todas as falas, de todo querer, de todo saber, de todo vencer, de todo viver.
Outro sentimento não me vem ao coração senão o de felicidade. Penso ser esta a palavra para definir melhor o que foi para nós a participação nas comemorações da Independência do Brasil realizada no último dia 8. Uma bela festa que ofereceu aos convidados a oportunidade de conhecer um pouquinho do nosso país, da nossa gente.
Há um mês ensaiavamos com os nossos alunos o jogo do maculelê para esta apresentação. Trabalho duro pois eles jamais tinham visto coisa parecida. Iniciamos, como muitos já fazem, com garrafas de plástico para trabalhar juntamente ao maculelê a consciência ecológica e de preservação do meio ambiente, algo urgentíssimo por aqui. As aulas fizeram tanto sucesso que chamaram até a atencão dos moradores da comunidade que fica ao lado de Kay-Nou, que passaram a acompanhar as aulas de cima de suas casas.
Além de ensinar os movimentos e algumas músicas, tivemos de inspirá-los ao o quê realmente é o maculelê, fazer com que sentissem a veia do guerreiro que anseia pela liberdade, que faz do seu brado a sua arma, que faz dos bastões a extensão do seu corpo para fazer tombar o opressor. Essa conecpção ajudou muito para convencer os jovens de usar os saiotes de palha da costa, no início dos ensaios quando falamos da vestimenta alguns se recusaram sumariamente.
E valeu. Os alunos assimilaram com uma facilidade impressionante e logo estavam dançando e cantando (em português) com uma desenvoltura incrível. “Dou boa noite pra quem é de boa noite. Dou bom dia pra quem é de bom dia. A benção, meu papai, a benção. Maculelê é o rei da valentia”.
O maculelê foi tão bem aceito que duas de nossas alunas compuseram músicas em Criole. Um resultado realmente fascinante que emocionou a todos que estiveram presentes no evento. E o destaque maior ficou por conta das crianças que deram um show.
E como não poderia faltar também tivemos uma bela e especial roda de capoeira, que contou com a participação de soldados do BRABATT. Uma oportunidade preciosíssima para nossos alunos de estarem em contato com mais capoeiristas, estilos, cânticos.
A roda, repleta de boas energias, de Axé, reuniu brasileiros e haitianos. Mais um belo exemplo do potencial da capoeira para unir povos e diferentes em um mesmo espaço de celebração, onde todos se fazem um; um só corpo, uma só mente, uma só voz, um só olhar. Todos irmanados pelo sentimento de fraternidade e filhos da mesma Mãe gentil, que recebe em seu seio farto todos os povos: o planeta TERRA.