No post anterior falava sobre como a nossa percepção se torna mais aguçada quando ficamos um longo período longe da nossa terra. E de como nos damos conta de detalhes que antes passavam despercebidos. Mas, certas coisas não necessitam de esforço para serem notadas. As precárias condições do sistema de saúde é uma delas.
No Haiti a saúde é um dos grandes problemas da população. E somados a alimentação deficiente, a falta de saneamento básico e de hábitos de higiêne pessoal criam um quadro profundamente degradante. Algumas instituições contribuem para minimizar este problema, como é o caso da Terra dos Homens, que desenvolvem um belo e louvável trabalho de saúde com crianças do Sul do Haiti.
Não tive oportunidade de conhecer mais a fundo o sistema de saúde do Haiti, mas o brasileiro este conheço muito bem. E em poucos dias de visita ao Brasil já deu para me certificar que os problemas permanecem. E dois acontecimentos me levam a esta conclusão.
O primeiro ocorreu no bairro da Glória, quando caminhava para o trabalho. Deparei com um guardador de carros estirado no chão. Auxiliado por um amigo, estava desacordado e apresentava um quadro de pressão alta. Eu verificava os sinais vitais enquanto um taxista acionava o serviço de emergência (SAMU). No entanto, o atendimento foi extremamente demorado. Tempo suficiente para ele melhorar e apresentar depois um quadro de infarto do miocárido. Graças a Deus o socorro chegou, após a ligação de muitas pessoas.
Dois dias depois, estava pela Lapa quando avistei uma jovem desmaiada sendo carregada por várias pesssoas. Desta vez, tivemos a sorte de contar com o apoio dos alunos do curso de enfermagem da UNIGRANRIO. Enquanto eles prestavam o primeiro-socorro acionamos mais uma vez o serviço de emergência. Porém, desta vez, nem mesmo consegui aguardar a chegada da ambulância. Esperamos por mais de quarenta minutos sem sinal das sirenes do SAMU.
Porém, pior que o SAMU foi a viatura da Guarda Municipal que passou por nós sem sequer averiguar o que estava acontecendo. Assim, ficaram duas dúvidas. Uma. Eles acharam que a ocasião não era da alçada deles. Mas, até onde sei, prestar socorro é dever de todo cidadão, que dirá um servidor. Duas. Eles não se deram conta do que estava acontecendo. E neste caso permanece o erro, pois são eles encarregados de prezar pela ordem urbana. E se um homem estendido na calça, com inúmeras pessoas à sua volta chama a atenção de uma pessoa comum, de um policial então…
E outros tantos são os problemas que não precisam de um olhar mais apurado: Disparos de fuzil; as ruas repletas de moradores de rua que formam verdadeiras confrarias… Mas, assim como o Haiti, ainda estamos amadurecendo, aprendendo a lidar com a liberdade. No Haiti encontramos algumas práticas que aqui já não vemos mais. E, certamente, hoje convivemos com outras tantas que no futuro deixarão de existir. Ainda que para isso seja necessário algumas boas décadas.
O lixo nas ruas é um bom exemplo do estágio de amadurecimento do povo. Tanto para nós braisleiros, quanto para os haitianos, ainda é muito difícil alcançar a consciência de que o bem e o espaço público pertence a todos nós e de que cada um é responsavel pela sua preservação. A diferença é que aqui contamos com um serviço de limpeza urbana eficiente, se comparada as duas realidades.